Post by lus trindade on Jun 28, 2007 7:39:17 GMT -5
O homem que nunca olhava nos olhos….
Ergueu o corpo lentamente da cama fria, a humidade roía os cobertores aos poucos assim como lhe comia também a mente fragmentada pela dor que não conhecia.
Não sabia o porquê daquela dor, os olhos feridos pela amargura de algo que ele não partilhava espelhavam-se no chão enquanto ele caminhava sozinho pelas ruas e vielas daquela cidade. Todos o olhavam como o mendigo perdido entre a lucidez da fome que atormenta e os pensamentos erráticos da droga que não consumia, ele não o era, a fome há muito tinha desaparecido quando o sangue das vitimas da gula escorria pela sarjeta do matadouro que ele olhava com desprezo, e a droga, essa nunca o atormentou porque a sua mente era constantemente lunática, não possuía a necessidade de se perder na construção artística da influencia de substancias proibidas por uma sociedade que não as entende mas que as idolatra numa marginalidade pecadora de fruto apetecido.
Sentava-se todos os dias na mesma mesa de café, bebia todos os dias a mesma bebida, café!, quem o olhasse sentado, distante, quase perdido naquela mesa de café do centro da cidade, encontraria no seu semblante o horror da rotina daqueles que não têm objectivos, que morrem aos poucos dentro da carne que lhes transporta a essência. A sua presença estava já marcada a espaços brancos na mente das pessoas que frequentavam os mesmos locais, que lhe sentiam a raiva a transbordar através da sua indiferença para contudo. Esses humanos sedentos de conhecimento, sedentos de possuir a razão não tardaram em lhe atribuir inúmeros rótulos aos quais ele não respondia, talvez ele nem soubesse o quanto aquelas pessoas o queriam conhecer, ou tentar, lidam mal com a diferença os humanos que nos rodeiam, lidam mal com a dor pensando que tudo temos que fazer para a mudar, talvez aquela figura negra não tivesse medo do pensamento, e se a sua dor fosse a sua alegria de viver para quê alterá-la.
Nunca mais esqueço o dia em que aquele homem nos mostrou o sentido da vida mais íntima e pessoal, que nos escapa quando acordamos para seguir a maioria. Todos temos uma cama seca onde dormimos imaginando a felicidade num sonho vago mas pujante, todos temos nos olhos alegria ou tristeza, todos temos o que queremos ter, e o que queremos ter mas não temos, é a busca insaciável da vida que nos delimita os movimentos e nos apodrece a carne, maldito relógio que conta o tempo, maldita invenção que nos come a mente e limita o pensamento, o ser humano cansa-se só de olhar para o relógio mastigando sentimentos em que só ele se encaixa.
Ele era o homem que não tinha relógio, não o tinha por não precisar dele para contar ou controlar os pensamentos. Mas acima de tudo ele não o queria, com ele viriam as obrigações, com ele viria a idade, ele não desejava a régua cronológica que nos marca a vida entre o nascer e o morrer comuns. O homem que acreditava na vida sentava-se sozinho, comia sozinho, mas não comia o seu amigo, fumava cigarros enquanto caminhava iluminado pelos candeeiros da noite, e no fim, quando se deitava na cama húmida observando o tecto do quarto que lhe albergava a carcaça, deixava fugir a essência por segundos e voava por aí, por esses locais que nós não queremos conhecer.
Ele sim, vivia por prazer de viver, para ele a linha do tempo não existia, sua mente era o todo que o forçava a caminhar, que o forçava a respirar, ele gostava de ser o que só para ele mesmo ele era.
Ele era o homem que nunca olhava nos olhos, que passava por mim nas manhãs frias de Inverno com os olhos colados ao chão, e todos pensavam que ele não via o mundo, mas ele via-o, via-o de dentro, via-o nos meus sapatos rotos, via-o nos paralelos gastos dos passeios de onde nunca se desviava. Acredito que ele nunca me olhou nos olhos, talvez nunca se tivesse olhado nos próprios olhos, talvez tivesse medo de se ver como não pensava ser, porque ele era só um humano, mas um humano mais humano que os outros.
A sua vitória sobre os outros não sei se ainda resiste, mudei de zona, não havia mais carros para estacionar naquela rua movimentada por onde ele sempre caminhava, talvez os paralelos já não sejam os mesmos, os meus sapatos já não o são, agora não estão rotos… e a minha face mudou mas não creio que ele desse por isso, ele era o homem que nunca olhava nos olhos….
Ergueu o corpo lentamente da cama fria, a humidade roía os cobertores aos poucos assim como lhe comia também a mente fragmentada pela dor que não conhecia.
Não sabia o porquê daquela dor, os olhos feridos pela amargura de algo que ele não partilhava espelhavam-se no chão enquanto ele caminhava sozinho pelas ruas e vielas daquela cidade. Todos o olhavam como o mendigo perdido entre a lucidez da fome que atormenta e os pensamentos erráticos da droga que não consumia, ele não o era, a fome há muito tinha desaparecido quando o sangue das vitimas da gula escorria pela sarjeta do matadouro que ele olhava com desprezo, e a droga, essa nunca o atormentou porque a sua mente era constantemente lunática, não possuía a necessidade de se perder na construção artística da influencia de substancias proibidas por uma sociedade que não as entende mas que as idolatra numa marginalidade pecadora de fruto apetecido.
Sentava-se todos os dias na mesma mesa de café, bebia todos os dias a mesma bebida, café!, quem o olhasse sentado, distante, quase perdido naquela mesa de café do centro da cidade, encontraria no seu semblante o horror da rotina daqueles que não têm objectivos, que morrem aos poucos dentro da carne que lhes transporta a essência. A sua presença estava já marcada a espaços brancos na mente das pessoas que frequentavam os mesmos locais, que lhe sentiam a raiva a transbordar através da sua indiferença para contudo. Esses humanos sedentos de conhecimento, sedentos de possuir a razão não tardaram em lhe atribuir inúmeros rótulos aos quais ele não respondia, talvez ele nem soubesse o quanto aquelas pessoas o queriam conhecer, ou tentar, lidam mal com a diferença os humanos que nos rodeiam, lidam mal com a dor pensando que tudo temos que fazer para a mudar, talvez aquela figura negra não tivesse medo do pensamento, e se a sua dor fosse a sua alegria de viver para quê alterá-la.
Nunca mais esqueço o dia em que aquele homem nos mostrou o sentido da vida mais íntima e pessoal, que nos escapa quando acordamos para seguir a maioria. Todos temos uma cama seca onde dormimos imaginando a felicidade num sonho vago mas pujante, todos temos nos olhos alegria ou tristeza, todos temos o que queremos ter, e o que queremos ter mas não temos, é a busca insaciável da vida que nos delimita os movimentos e nos apodrece a carne, maldito relógio que conta o tempo, maldita invenção que nos come a mente e limita o pensamento, o ser humano cansa-se só de olhar para o relógio mastigando sentimentos em que só ele se encaixa.
Ele era o homem que não tinha relógio, não o tinha por não precisar dele para contar ou controlar os pensamentos. Mas acima de tudo ele não o queria, com ele viriam as obrigações, com ele viria a idade, ele não desejava a régua cronológica que nos marca a vida entre o nascer e o morrer comuns. O homem que acreditava na vida sentava-se sozinho, comia sozinho, mas não comia o seu amigo, fumava cigarros enquanto caminhava iluminado pelos candeeiros da noite, e no fim, quando se deitava na cama húmida observando o tecto do quarto que lhe albergava a carcaça, deixava fugir a essência por segundos e voava por aí, por esses locais que nós não queremos conhecer.
Ele sim, vivia por prazer de viver, para ele a linha do tempo não existia, sua mente era o todo que o forçava a caminhar, que o forçava a respirar, ele gostava de ser o que só para ele mesmo ele era.
Ele era o homem que nunca olhava nos olhos, que passava por mim nas manhãs frias de Inverno com os olhos colados ao chão, e todos pensavam que ele não via o mundo, mas ele via-o, via-o de dentro, via-o nos meus sapatos rotos, via-o nos paralelos gastos dos passeios de onde nunca se desviava. Acredito que ele nunca me olhou nos olhos, talvez nunca se tivesse olhado nos próprios olhos, talvez tivesse medo de se ver como não pensava ser, porque ele era só um humano, mas um humano mais humano que os outros.
A sua vitória sobre os outros não sei se ainda resiste, mudei de zona, não havia mais carros para estacionar naquela rua movimentada por onde ele sempre caminhava, talvez os paralelos já não sejam os mesmos, os meus sapatos já não o são, agora não estão rotos… e a minha face mudou mas não creio que ele desse por isso, ele era o homem que nunca olhava nos olhos….